O filme A Mulher do Rei, busca inspiração em suposta história das guerreiras Agojie, mulheres pretas africanas que formavam um exército e lutavam contra a invasão europeia.
O longa que também está nos cinemas do Brasil, tem feito sucesso pelo mundo, por passar uma mensagem de valorização da mulher preta e de empoderamento feminino poucas vezes, ou talvez nunca, visto na história do cinema.
A mensagem central do filme é uma só: pela liberdade, contra a opressão, lute como uma mulher!
Você deve estar neste momento se perguntando:
Mas o que isso tem haver com samba de roda?
Muita coisa:
A maior parte dos escravos traficados para a Bahia, vinham da região conhecida como costa dos escravos, palco das batalhas e histórias do filme “A Mulher do Rei” e, entre ficção e verdades do filme, fato é que a força das guerreira Agojie, das mulheres pretas africanas, também pode ter desembarcado no Brasil.
Descortinando a história para olhar mais de perto a realidade da formação sociocultural brasileira, podemos afirmar que esta força feminina se fez presente no nosso país, mas infelizmente isso não ficou registrado na maior parte dos nossos livros de história.
Nas últimas décadas o termo empoderar surgiu com grande força e, mais que conceder poder, empoderar é mostrar a alguém seus valores, seu potencial, sua importância.
Assim, o empoderamento feminino surge da necessidade não apenas de conceder às mulheres o poder de participação social, mas o de mostrar a elas e a toda sociedade, que ao longo da história, tiveram participação na formação do seu povo, do seu país.
No Brasil, não poderia ser diferente: as mulheres pretas muitas vezes escravizadas, podem ser consideradas guerreiras que tiveram participação não apenas valorosa, mas determinante na defesa e preservação das nossas raízes culturais mais autênticas e portanto, na formação sociocultural do povo brasileiro.
Na história do samba aliás, isso é ainda mais forte: ao longo da estruturação de nossa mais autêntica identidade cultural, a presença feminina não foi apenas marcante, mas decisiva.
O samba no seu formato mais embrionário, começou a ser gerado no seio das mulheres pretas escravizadas que, arrancadas de sua pátria mãe, adotaram o Brasil, e principalmente a Bahia como lar.
Mas, embora a milhas distantes de sua pátria mãe, elas não esqueceram suas raízes:
Assim, no recôncavo Baiano, estas mulheres imprimiram sua marca na estética e na política da cultura popular, por meio de manifestações culturais para manter as raízes ancestrais africanas, que por vezes tinham que vir disfarçadas em cultos religosos ligados a Igreja Católica, como os ternos de reis, terno do acarajé, cheganças, ou a cultura indígena como o maculelê e secretamente, capoeira (proibida no Brasil até 1930) e candomblé, que foi proibido inclusive pela constituição de 1824, sendo autorizado a funcionar durante a era Vargas mas, sob severa vigilância do governo.
Assim, das mulheres pretas que mesmo escravizadas e oprimidas tiveram a coragem de manter viva suas raízes culturais, se reunindo escondido, fazendo questão de transmiti-las aos filhos, até as tias baianas que faziam de seus terreiros, na então Pequena África, região portuária do Rio de Janeiro, um lugar dedicado a liberdade inclusive de expressão cultural, o samba nasceu, cresceu e se tornou símbolo do país.
E era justamente nestes quintais e terreiros da Bahia e do Rio de Janeiro que surgia e se aprimorava uma vertente cultural na qual, cabia às mulheres formar a roda e dançar, enquanto os homens apenas tocavam batiam na palma da mão e entoavam seus cantos.
Nascia o samba de roda que posteriormente daria origem ao samba com diversas outras vertentes e que é hoje, a mais autêntica expressão da cultura brasileira.
Pesquisa/texto: Deusa de Malê / Lília Araújo