Como já cantávamos em “Rio 40 Graus”, o Rio é um grande “purgatório da beleza e do caos”. A música traz a poesia de uma cidade cheia de desarmonias, que se encontram e se afinam entre a paisagem dos cartões postais e a realidade das comunidades, oscilando entre o jeito do carioca de ver a vida e os inúmeros problemas sociais existentes, da corrida para alcançar o ônibus lotado de manhã a caminhada suave no calçadão de Copacabana, das gírias, dos gestos e traços que formam a alquimia carioca.
É na busca de entender a psique confusa e tão contraditória que habita nesta geografia, que chega às livrarias “Rio, o Ori”. A obra retrata uma cidade arrastada por dores e delícias, pela complexidade dos interesses que a constituíram e que tem nos seus modos uma psicologia das ruas. Dessa forma, faz ecoar vozes oprimidas, com suas memórias sobre o lugar que temos e aquele que almejamos ter, na busca de uma paisagem mais inclusiva e humana.
Para tanto, traz histórias inspiradas em figuras como Marielle Franco, Seu Ubirany e mestre Monarco, que desfilam por textos com densidades e levezas extraídas de vivências de pessoas tidas como menos importantes, mas que modelam o Ori desta cidade, que em iorubá significa “cabeça”. Se referindo a um destino ou intuição espiritual, Ori é a persona, com toda a sua força e grandeza. Logo, a psicologia da cidade se lê em quem a compõe e na forma como se organiza.
De autoria da escritora Valesca Lins, “Rio, o Ori” é um livro de reconhecimento e reflexão. Carioca, dramaturga, pedagoga da rede pública de ensino e psicanalista, é autora de várias outras obras literárias:
“Será que meus destroços estão despertando? Talvez, sim! Sou boa aprendiz, sei rasgar-me e mesmo assim, permanecer inteira’. Neste pensamento de uma das personagens de um dos contos do livro faço alusão ao que penso ser o Rio de Janeiro. Um lugar despedaçado que se mantém vivo e pulsante, pois a cultura é a gira que faz tudo rodar. As histórias trazem este e outros aspectos formadores da cidade, além de encontros, memórias ancestrais, críticas, violências, o abandono estatal que acaba por fazer as pessoas buscarem auxílio em algo que pode suscitar ódios”, explica.
E completa: “Ao mesmo tempo que é um canto de amor ao Rio, é um clamor para que a gente se revisite como povo. Apesar de uma geografia específica, os textos podem se comunicar com qualquer um, pois os sentimentos, situações vivenciadas pelas personagens tocam o solo comum a todas e todos”.
O lançamento do livro acontece no próximo sábado, 09 de junho, às 18h, no Samba Capitu, localizado na Rua da Constituição, 54 – Centro – RJ. O livro está disponível na plataforma Amazon.
Sobre Valesca Lins
A carioca de 44 anos, apaixonada pelo Flamengo e pela Portela, mãe de Marina Morena, pedagoga da rede pública e estudante de psicanálise, tem muito a dizer e não para de produzir. No momento, está mergulhada em mais um livro de contos que está escrevendo sobre o Rio de Janeiro, já em negociação com editoras.
Lins descobriu que podia passar suas ideias para o papel em 2017, quando teve o texto “Pretinho básico para o Ipiranga” publicado no site do Museu Paulista da USP, também conhecido como Museu do Ipiranga. O texto foi selecionado no concurso “O que você quer ver no Ipiranga em 2022”.
Em 2018, publicou o artigo “Patologização e medicalização da vida: tentativa de banir o incontrolável”, no Seminário de Educação Medicalizada, na UFBA.
Participou também da antologia “Negras crônicas: escurecendo os fatos” – com as crônicas “104 histórias como esta” e “Revelações de cenas do cotidiano” –, lançada em 2019, pela editora Villardo.
Em 2020, participou da antologia “Parem as máquinas” pelo selo Off Flip, com a poesia “Semente”, e teve o poema “Ela quer tudo” publicado na revista Escritores Contemporâneos, edição poetas negras.
O livro “Minhas conversas florescidas no khat”, lançado em 2021, é sua primeira publicação pela Giostri.